segunda-feira, 19 de março de 2012

Vaga-lumes

Vinte anos, trinta anos!... Mas o que é o tempo?

- Vavá, lembra aquela viagem a Visconde de Mauá, quando furou o pneu na estrada à noite?

- Lembro...

- Foi horrível!...

- Foi!... Mas ali, eu vi uma coisa que nunca mais vi, e que nunca mais esqueci...

Ana não me deixou completar a frase.

- Os vaga-lumes!

Batemos nossas mãos no ar, clap!

A força da lembrança iluminou a cena:

Estrada de terra, pneu furado, motorista esbravejando.

De repente alguém fala, "Olha!..."

Na densa floresta acima de nós, centenas, milhares de vaga-lumes piscavam suas luzinhas quebrando com delicadeza a escuridão. A beleza nos obrigou a parar, esquecer o pneu furado, a fome, a vontade de chegar...


A constatação da amizade e de que o tempo é nada.

domingo, 11 de março de 2012

Intimidade

Em tempo de Amores líquidos, quando é difícil aprofundar os relacionamentos e amizades, a exposição de fotografias da norte americana Nan Goldin no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em cartaz até 8 de abril, é chocante e tocante ao mesmo tempo por mostrar a INTIMIDADE das pessoas, aquilo que a gente costuma esconder, e quando chega lá vem aquela velha frase: "A intimidade é uma merda".

Rostos sem maquiagem, caras tortas de recém-acordar, roupas sujas espalhadas pelo chão, manchas roxas em corpos nus. Nada é disfarçado, nada é fake nas fotos de Nan Goldin, pelo contrário, a realidade é nua e crua. Um exemplo é a foto da mulher que acabou de fazer amor e, nua, lava o sexo com um chuveirinho no bidê. Sorrindo.

As fotos de Nan Goldin nos levam a refletir sobre a beleza das imagens da nossa rotina menos glamurizada: acordar com os olhos inchados, escovar os dentes, fazer pipi e cocô, dar comida aos cachorros, descascar batatas, cozinhar...

Como disse o nosso querido Nelson Rodrigues, "de perto ninguém é normal". Eu acrescentaria: de perto ninguém é comum. Cada um de nós é um universo de particularidades e beleza por mais banais que pareçamos ser na superfície. Mas quem tem coragem de mergulhar fundo para descobrir o tesouro? Quem tem coragem de experimentar a INTIMIDADE?

Pra ser sincera, fiquei com vontade de ser modelo da Nan Goldin.

- Ei, Nan! Quer dar um pulinho no Rio de Janeiro, na Rua João Lira, no Leblon?

quinta-feira, 1 de março de 2012

A morte de uma criança

Devia ser proibido morrer criança. Não faz sentido na nossa mente limitada de humanos. Mas quem somos nós para julgar os desígnios de Deus?

Nesta terça-feira, 28 de fevereiro de 2012, meu filho Gabriel perdeu um de seus melhores amigos, o querido Vitor, de morte natural, de repente, sem qualquer aviso ou sintoma.

Os dois têm 13 anos. Os dois desceram juntos a ladeira da escola, chegaram ao ponto de ônibus e se despediram: “Até amanhã”.

Mas naquela mesma tarde a morte chegou e, com sua violência natural, alterou as rotinas de todos que conheciam o Vitor.

Vitor tinha uma risada que todo mundo ria quando escutava.

Ao terminar de bater um 'pratão' de comida na nossa casa, eu lhe perguntava:

- O que vc quer de sobremesa? Tem melancia, melão, manga...

Ao que ele sempre respondia:

- Banana.

Eu ria, porque banana é uma fruta forte, que enche a barriga da gente... Mas ele gostava mesmo era de comer banana de sobremesa.

Vitor tinha medo de cachorro, porque já tinha levado mordida. Mas uma vez viajamos com a madrinha do Gabriel, e ela tem um cachorro que late sem parar, e ele foi no carro com cachorro e tudo... Deve ter perdido o medo!

A morte do Vitor é um caminhão desgovernado que investe, a 100 Km por hora, nas pilastras da nossa fé.

Nosso Amor à família Rubim. Muita Paz e Luz.

Oração das Crianças

Por favor, Senhor, permita-me crescer forte e seguro sob tua proteção e guia.

Protege, oh Senhor, minha família, meus amigos, meu país e minha fé.

Tem paciência, Senhor, conosco, as crianças, para que possamos aprender a amar-te, conhecer-te e viver perto de ti.

Amén


Abaixo, Vitor (esq.) e Gabriel em Buzios, RJ.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Carnaval 2012

Carnaval, para mim, é como a Meditação da Rosa Mística, que nunca cheguei a fazer (vontade não falta). Essa meditação dura três horas e funciona assim:

Um grupo de pessoas se reúne passa a primeira hora rindo. Mesmo que não sinta vontade de rir, deve forçar o riso. Lá pelas tantas, as risadas - de verdade - vem com tudo. A gente se acaba de rir. Aí vai serenando, serenando, e vem a segunda hora, quando se deve chorar. Após os primeiros choros forçados, chegam os choros ancestrais. Que medo! Aí vai serenando, serenando... E a terceira hora é em silêncio. Para cada um tirar as próprias conclusões.

Mal comparando, no Carnaval eu chego de mansinho... Esse ano vai ser diferente? Será que não vou gostar tanto do Carnaval? Mas aí eu vejo toda aquela gente sorrindo, cantando, dançando no meio da rua. É uma festa cheia de gente - e festa boa. Temos permissão para parar tudo e festejar, todos juntos, no meio da rua. Que maravilha!

Começo a cantarolar baixinho, mexer os pés e a coisa vai crescendo, aparecendo, e daí a pouco sou tomada pela festa. Não quero mais parar. Esse ano foi assim, mais uma vez.

Fantasias engraçadas que eu vi:

. Negão de camisa, chapéu panamá, óculos escuro e o nariz pintado de preto...? Era o Mestre Cartola, gente!
. Bando de amigos com bombom de Serenata de Amor ao redor do bumbum.
. Três moços altos, louros, com caras de gringo, vestidos como comissários de bordo. Levaram um avião inflável e ficavam jogando para o alto no meio da multidão.
. Homem enorme de gordo com peruca chanel, vestido vermelho, dentões brancos postiços e um coelho de pelúcia azul na mão: Mônica e Sansão!
. Homem de lata, do Mágico de Oz: no lugar do pinto tinha uma torneira de onde saía suco de pêssego com vodka... Eca!

Eu me fantasiei de policial, índia, rastafari e dondoca. No dia da policial, aos engraçadinhos que vinham pedir "me prende, me prende", eu respondia: "Não posso, tô em greve!"

Bem que podia ter mais um Carnaval no meio do ano!

Abaixo, o baile do Cordão do Boitatá na Praça VX, Rio de Janeiro, no domingo de Carnaval.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Mulher com criança no colo

Subi no ônibus, era duas da tarde, um sol escaldante do lado de fora. Senti o cheiro. Que cheiro era aquele? Parecia urina seca, forte!

Assim que passei a roleta, a cena: no espaço reservado para cadeirantes, uma mulher negra, muito velha, envolta em trapos, os pés inchados enfaixados, um saco plástico envolvendo a carapinha branca, sentada em sua cadeira de rodas, atada às ferragens do ônibus, tendo nos braços uma criança adormecida. Um menino mulato, gordinho, só de shorts, e ela segurava-o firmemente.

Quem seria aquela criança? Um neto? Pelo cuidado com que tomava conta do menino, poderia ser, sim.

Uma moça no banco atrás de mim fez uma careta, tapou o nariz com os dedos e mudou de lugar. Foi sentar bem longe, lá atrás, no último banco do ônibus.

E eu fiquei admirada, hipnotizada pela imagem da velha com o menino nos braços. Cheguei a pensar, o pensamento mesquinho: “Melhor parar de olhar ou ela vai me pedir dinheiro”.

Mas que nada, ela tinha dinheiro. Entrou um vendedor de balas no ônibus e ela sacou um porta-níqueis, tirou de lá uma moeda e comprou dois pacotinhos de amendoim. O menino desacordado, suado! Mas ia ter o que comer quando despertasse.

Eu continuava olhando. Era uma cena bela! Como podia ser bela aquela mendiga velha, suja e fedorenta com o menino no colo? Mas era.

Chegou a hora de saltar. Passei pela mulher e, nesse exato instante, um dos pacotinhos de amendoim caiu das mãos dela, foi parar no chão, perto da roda da cadeira de rodas.

- Filha, vc pega pra mim?

- Claro!

Abaixei e peguei o amendoim, entreguei nas mãos dela com um sorriso, e ela sorriu de volta pra mim, o menino dormindo.

Fui embora imensamente agradecida por ter sido merecedora de um olhar daquela mulher. Por poder lhe entregar o amendoim.

A Beleza guardada dentro de mim.

domingo, 15 de janeiro de 2012

El Tigre

Já escrevi sobre Ele antes, e aqui vai novamente: El Tigre é o meu passeio favorito em Buenos Aires. Todas as vezes em que visitei a capital portenha nunca deixei de ir lá.

Dessa vez, fomos visitar o antigo cassino que foi todo restaurado. A propósito, ao caminhar pela beira do rio, vemos que tudo ali foi recuperado. Perguntamos aos nossos amigos, mais tarde, e a resposta: um político aposentado, natural daquela província, voltou para lá e resolveu ajeitar tudo. Investiu dinheiro do próprio bolso, reurbanizou...

O resultado é visível aos olhos e ao coração: canteiros cheios de hortências – cor de rosa, nunca tinha visto nesse tom! –, caminhos para pedestres e ciclistas, tudo novo e bonito.





Mas o cassino... É de cair duro para trás! Parece que viajamos no tempo e voltamos à época descrita por Fitzgerald em O grande Gatsby. O prédio, que andou fechado e abandonado por décadas, foi todo restaurado, assim como a riqueza dos interiores: ricos afrescos no teto, delicados detalhes em ouro, magníficos lustres de cristal... Pena que não deixam tirar fotos lá dentro.





Fomos em dia de semana e éramos os únicos visitantes: um silêncio, um frescor!...

E a passarela de mármore onde as pessoas, antigamente, ao perderem tudo no jogo, corriam e se jogavam no rio – um gesto dramático, pois não acredito que a profundidade ali dê para isso -, descortina a vista emocionante do Tigre.



Enfim, se algum de vocês for a Buenos Aires, vá visitar El Tigre. Vale muito!

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Ação entre amigos - Reveillón em Paraty

A dica era do meu amigo Ricardo, que mora em Paraty: “Quando chegar à praia, tenta reunir um grupo de pessoas para dividir um barco e ir ao Saco do Mamanguá” OK!

No dia 29 de dezembro, saímos de Paraty às 11h da manhã e fomos a Paraty Mirim, praia de águas calmas a 40 minutos da cidade histórica. Tempo nublado, feio, mas sem chuva. Chegando lá, fui logo abordada por um barqueiro. Valor do passeio: R$ 120,00.

Encontrei uma família grande, 5 pessoas, e convidei a dividir com a gente. Toparam! Mas no que eu fui nadar, atravessar o rio – água gelada! – e voltei, a notícia:

- Olha, aquela família que tinha combinado com a senhora já foi.

- Como assim, já foi?

- Não quiseram esperar e foram.

Como diz o meu namorado: “Falsos!”

Comecei novamente do zero: abordar as pessoas na praia – não eram muitas –, explicar o que é o Saco do Mamanguá – um fiorde brasileiro, um braço de mar terra adentro, cercado de montanhas e floresta por todos os lados –, dizer o valor etc.

Um jovem professor de educação física, acompanhado da sobrinha de 20 anos e do filho pequeno aceitou, animadíssimo. Uma família de cearenses e paraibanos residentes em São Paulo – 6 adultos e uma criança – também. Éramos 13.

- Ah, minha senhora, o meu barco não agüenta. Só tem lugar pra 12!

Fomos atrás do Seu Ademir, que estava tomando uma cerveja em um bar sabe-se lá onde, dono de um barco com capacidade para 15 pessoas. Mas o valor aumentou: R$ R$ 150,00, e isso deu início a nova rodada de negociações.

Moral da história: o barco partiu quase às quatro da tarde, todo mundo sem almoçar, o céu parecendo que ia desabar nas nossas cabeças, de tão escuro. Mas eram tantas as risadas, tanta a vontade de viajar – a essa altura mais pela alegria e a novidade daquela ação entre amigos recentes e tão diferentes – que lá fomos nós...

E sabe que a chuva não caiu? Esperou a gente ir e voltar: 3 horas de passeio com direito a parada em uma aldeia de pescadores para comer batatinha frita com coca-cola.

Chegamos de volta em Paraty Mirim quase às sete da noite, tudo escuro, um frio!... Mas todo mundo feliz e com as bochechas doendo de tanto rir e sorrir.

Abaixo, a melhor turma do Ano Novo em Paraty. Seu Ademir à esquerda, de camisa branca.