sábado, 25 de setembro de 2010

Coisas que lembram pessoas

Meu pai era um intelectual que vivia cercado de livros, revistas e jornais. Mas todo sábado e domingo de manhã ele se dedicava ao jardim.

Era um jardim imenso, em terreno inclinado, difícil de cultivar. Ele mesmo tratou de construir jardineiras em patamares e as enchia de flores. Todo mês de maio viajava à Europa e trazia de lá montes de pacotinhos com sementes. No jardim do meu pai, só entravam plantas que dessem flores. Nada de folhagens.

Por causa disso, sempre que vejo flores - silvestres, em um canteiro, em um jardim, no mato - eu me lembro do meu pai. É uma forma linda, delicada e alegre de lembrar do meu pai.





Da mesma forma, lembro da minha avó Violeta toda vez que como uma sobremesa gostosa. Ela era cozinheira de mão cheia, mas gostava mesmo de fazer doces. Não ligo para doces, gosto mais do sabor salgado. Mas quando vou a algum almoço ou jantar e a sobremesa é deliciosa, lembro da vovó. É uma forma gostosa e afetuosa de lembrar dela.

E vocês, quais coisas boas lembram pessoas queridas?



sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Porque o Amor é lindo...

... porque ele dissolve a rigidez, faz surgir pontes no meio do nada, cria um amálgama onde tudo se harmoniza e se recria.

E assim, numa segunda-feira à noite, quando todos dormem e se preparam para o longo dia de trabalho na manhã seguinte, o casal sai para passear...

Uma longa conversa em mesa de mar

Uma janela aberta com vista para o céu

Lua crescente

Música vibrante

E o Amor tornando tudo mais brilhante, aconchegante e feliz.



sábado, 11 de setembro de 2010

O poder da palavra

A menina vem andando pela rua e, em direção contrária, vêm dois meninos; um deve ter 8 anos e o outro, menorzinho, uns 6. O mais velho tem a pele do rosto manchada. Ao passar por ela, fala:

- Me passa o celular ou eu vou te esfaquear.

Esfaquear - atacar com faca.

A menina diz 'Não" e atravessa a rua correndo. Do outro lado, duas mulheres que passeiam com seus cachorros a acolhem.

- Vão embora, seus moleques! Vão para a igreja rezar! - grita uma delas.

Mas eles já sumiram.

Os meninos eram crianças pequenas, não eram fortes, um safanão os atiraria longe. Apesar da ameaça, não havia faca à vista. Mas o poder da palavra...

- ... eu vou te esfaquear!

As mãos da menina ainda tremem.



terça-feira, 7 de setembro de 2010

Não pode desistir

Leio o perfil do empresário brasileiro Sérgio Habib, 52 anos, maior distribuidor de automóveis da marca Citroën no mundo, e fico sabendo que antes de se tornar "o Midas do setor automotivo", como é chamado na reportagem, afundou duas vezes. A primeira quando abriu uma rede de fast food em São Paulo, que fechou em menos de um ano. A segunda após investir R$ 15 milhões em uma sociedade com o estilista Ocimar Versolato, que faliu. Fico pensando: "E se, após o segundo fracasso, ele tivesse desistido?"

Assisto ao bom filme de rock The Runaways, disponível em algumas locadoras, sobre a trajetória de Joan Jett, cantora e compositora de músicas que tocam até hoje nas rádios como I love rock n roll e Crimson and Glover. Fico sabendo que antes de estourar ela naufragou no auge do sucesso de sua banda anterior, The runaways, porque a vocalista - uma junkie de 15 anos, simplesmente saltou fora do barco. Joan foi ao fundo do pântano, mas... Ressurgiu com os Blackhearts. Pensei que ela fosse desistir.

Recebo um telefonema de uma amiga me contando que a filha, que namorou durante anos um cara que não trabalhava e a menosprezava, terminou o relacionamento e vai se casar com outro: um jovem estrangeiro, no Brasil para fazer mestrado. As famílias já se conheceram e o casório será em maio do ano que vem, com vestido branco e tudo. Sabendo o quanto essa amiga sofreu e rezou para (ela é catoliquíssima), brinco:

- Mas o tanto que tu rezaste para isso acontecer, hein? Demorou, mas foi!

E ela:

- Pois é, Valéria. As coisas demoram, mas acontecem. Temos que rezar e esperar. Não pode é desistir!

O poder da síntese dessa minha amiga é incrível...

Abaixo, Joan Jett and The Blackhearts: I love rock n roll!


quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Ler devagar

Após slow food e slow travel, slow reading. Trata-se de um movimento iniciado por intelectuais europeus que propõe ler devagar e atenciosamente um livro inteiro, do início ao fim.

Pensei que somente quem trabalha no mercado editorial andasse lendo vários livros ao mesmo tempo, sem terminar nenhum. Fazemos isso porque o trabalho exige e se fôssemos ler cada um dos livros que nos chega às mãos, não faríamos mais nada. Mas fico sabendo, através de artigo no caderno Sabático, do Estado de S. Paulo, publicado sábado passado, que se trata de uma epidemia.

O fato é que internet encolheu a nossa capacidade de concentração e leitura de longos textos. Claro como água. Apesar do slow reading, acho que não tem como voltar atrás. Me dá uma tristeza: as novas gerações serão capazes de ler os grandes - e volumosos - clássicos? Crime e Castigo, Grande sertão veredas, Os miseráveis? Um amigo diz: "Mas esses, pouca gente leu até hoje, e vai continuar sendo assim". Será?

Em março desse ano, subi ao Bairro Alto, em Lisboa, debaixo de chuva torrencial, em busca de uma livraria que todo mundo indicou: Ler devagar. Cheguei lá em cima e, sozinha na paisagem desolada encoberta de nuvens e água, descobri que a livraria havia mudado de lugar. Pior: nenhum dos comerciantes a quem perguntei sabia a nova localização da livraria.

Voltei para casa molhada e desenxabida. Sinal dos tempos.