domingo, 22 de dezembro de 2013

O que é realmente importante

“O tempo passa cada vez mais rápido” “O tempo está voando” “Tudo anda tão corrido” Essas frases foram muito ditas e ouvidas em 2013. Mas o que estamos fazendo com nosso tempo?

Deu na coluna do Ancelmo (O Globo): o jornalista Roberto D´Avila perguntou a atriz Fernanda Torres como ela conseguiu se organizar para escrever o surpreendente romance Fim (Companhia das Letras) e ela respondeu: “É que eu não gosto de ir a festas”.

O Dr. Ivo Pitanguy diz em entrevista a Luiz Carlos Lisboa (2003): “Desde sempre, o aspecto social da minha vida foi menor do que parecia ou se comentava. Sempre fui regido pela disciplina séria que aprendi a ter”.

Minha mãe, às vésperas dos 75 anos, faz o comentário: “A vida passa depressa”. Argumento que ainda está passando, não acabou, e ela: “Mas eu pensava que seria jovem para sempre. Havia muito tempo para tudo. Agora sei que não é assim”.

Em setembro participei do workshop do escritor português Gonçalo M. Tavares durante a Feira do Livro de Caxias do Sul. Ele não ensina técnicas de escrita, mas trabalha a criatividade. No final, discorre longamente sobre os sacrifícios que escrever implica. Por exemplo, deixar de estar com as pessoas que amamos. Gonçalo passa todas as manhãs trancado em um escritório, das 8h às 13h, escrevendo. Deixa de desfrutar a companhia da mulher e dos três filhos. Seus pais, quando vem visitá-lo, já sabem que, apesar da saudade, não podem interrompê-lo. Se alguém importante telefona, passam um bilhete por debaixo da porta. Tudo isso porque ele também fez a opção pelo que é realmente importante para si.

Nesse fim de ano, proponho a reflexão: o que é realmente importante para você e a sua vida?

Depois que descobrir, firme um compromisso consigo para abrir espaço na rotina e ter energia para dizer ‘não’ ao que se interpõe no caminho. O tempo passa cada vez mais rápido, tudo está tão corrido... Então, e justamente por isso, vamos ao que interessa.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Praga é uma cidade mágica

Ao ver os letreiros na estação através da janela do trem, vogais com acentos diferentes e grupos de consoantes, pensei: "Tô ferrada". Se na Alemanha a comunicação já tinha sido difícil, na República Tcheca seria pior. Mas que nada. Praga me acolheu como uma senhora gorda e afetuosa que gosta de dar risadas.


Na estação de metrô, eu não tinha moedas para o bilhete que me levaria perto do hotel. Perguntei a uma funcionária e ela balbuciou com gestos: "McDonalds. McDonalds". Entendi que deveria ir ao McDonalds ao lado e comprar algo para trocar o dinheiro - coroas tchecas. Fiz o que ela mandou e deu tudo certo. Pronto. Eu estava em casa. Em Praga, saberia me virar, como se viram os brasileiros em todos os lugares.

Praga é linda, lembra um pouco Paris. O centro histórico é lotado de turistas, e aí lembra um pouco Florença. Mas o mais legal são as histórias. Tudo tem uma história, uma lenda.


Por exemplo, a igreja onde pende, até hoje, em uma cordinha, o braço mumificado do ladrão que tentou roubar o colar de ouro e brilhantes de uma estátua monumental de Santa Ana, toda em madeira, que continua lá. Conta-se que a santa acordou na hora do roubo e segurou o braço do homem. E não houve jeito de soltar, a não ser serrando o braço - do pecador, não da santa. Então, o ladrão se tornou devoto e cuidou da igreja até morrer de velho.


Outra lenda presente em todo lugar é a do Golem de Praga. Conta-se que o rabino criou um golem - criatura de força descomunal - a partir do barro da beira do rio Moldava. Durante muito tempo o Golem ajudou nas colheitas, na construção das casas. Mas quando sua fama ultrapassou as fronteiras e homens poderosos começaram a cortejá-lo, para ajudar nas guerras, o rabino o trancou na torre da sinagoga mais antiga de Praga, onde está até hoje.


Ao me lembrar dos dias que passei na capital Tcheca, sorrio sem querer. Um afago, um descanso, dias alegres e ensolarados na companhia da senhora gorda e afetuosa que gosta de dar risadas.

sábado, 16 de novembro de 2013

Preferências sexuais e a estética berlinense

Todas as preferências sexuais se encontram em Berlim. E tudo é normal. Diferente de outros lugares, até mesmo o Rio de Janeiro, eleito melhor destino gay por um site turismo estrangeiro. Aqui ainda é comum casais homossexuais andarem de mãos dadas, mas vigiando os arredores com os rabos dos olhos, à espreita da reação dos outros. Ou então, exagerar nas atitudes como uma forma de autoafirmação ou provocação. Em Berlim, isso simplesmente não existe. É tudo normal mesmo.

E tem para todos os gostos. Um rápido passeio pelos sites berlinenses sobre vida noturna revela estabelecimentos onde é possível vivenciar e compartilhar todo tipo de fantasia sexual. Sadomasoquismo é fichinha. Fiquei sabendo de uma tal boate onde, em um subsolo, uma vez por semana, acontece... ‘A noite do cocô’. Já pensou?

Meus passeios em Berlim foram mais diurnos, mas houve uma noite em que saí com a Nina e o Marcos, meus companheiros de apê. Ela nos levou a um bar/boate chamado ‘Chocolate’ onde haveria uma noite gay.

O bar fica no andar térreo de um prédio abandonado, invadido e pichado. ‘Essa é a estética berlinense: tudo meio destruído, mas transado’, explicou o Marcos. E tem mais: os lugares mais bacanas são sempre escondidos. Um turista sem amigos morando em Berlim não passará dos locais apontados nos guias de viagem. Se a Nina não tivesse estado lá antes, levada por outro amigo, não desconfiaríamos que aquela ruína abrigava um lugar tão legal quanto o ‘Chocolate’.

O público lá dentro nem era tão gay. Decoração maneiríssima e um DJ tocando somente vinil; um pé nos anos 80, mas nada óbvio. Finalmente chegou um casal gay com seu cachorrinho, um poodle preto que percorreu toda a boate, nem um pingo de xixi, muito educado. O casal sentou-se ao nosso lado, pediu vários gim tônica e fumou vários baseados de haxixe com tabaco. Acabamos batendo um papinho por causa do cachorro, que nos fez várias festas e, quando casou da música alta e do cigarro (sim, na Europa ainda se fuma intensamente dentro dos lugares), acomodou-se no chão sobre o casaco de um de seus donos e foi dormir.

Abaixo, a porta do nosso apê em Frankfurter Tor, bem no clima da estética berlinense.

sábado, 2 de novembro de 2013

Perder-se em Berlim

Berlim não é para fracos ou iniciantes. Todas as palavras não tem menos de 15 letras. A sinalização de informações não é clara, mas os alemães acham que é. Tudo é tão certo que, quando algo sai do normal, eles não sabem como resolver. Vou dar um exemplo:

No último dia em Frankfurt, planejamos conhecer Mainz, cidade medieval onde viveu Gutenberg, inventor da prensa de tipos móveis. Para evitar imprevistos, fomos à estação de trens na noite anterior e compramos nossos bilhetes: 15 euros cada. No dia seguinte, chegamos cedo à estação e fomos ao balcão de informações. Deu-se, então, o seguinte diálogo:

- Os trens para Mainz foram interrompidos e só voltarão a circular após as 15h - disse a mulher com cara amarrada em inglês tonitruante.

- Por que?

- Uma pessoa se atirou nos trilhos.

- Podemos reaver o dinheiro dos bilhetes?

- Não, pois o acidente não é culpa da ferrovia.

- Nem nossa tampouco.

- Próximo!

Para resumir, fomos orientadas por outro funcionário a pegar um trem até o meio do caminho, pois um ônibus viria buscar as pessoas na estação e levá-las a Mainz. Como na Alemanha é tudo tão certinho, nos entreolhamos e decidimos: "Vamos!"

Chegando ao destino, nós e a torcida do Flamengo, Vasco e Botafogo, ficamos parados ao relento, um vento gelado, esperando 1 hora pelo ônibus... que não veio.

Esse foi apenas um dos imprevistos durante a minha viagem a Alemanha. Houve vários. Desde alguns muito simples, como pedir uma taça de white wine e receber uma taça de red wine, até embarcar no trem errado na partida de Berlim para Praga.

Sobre o vinho, resolvi ficar quieta, pois reclamar seria tão complicado, e além do mais os alemães são bravos! Sobre o trem, desci na estação seguinte, desarvorada, e se não fosse uma alma boa que falava inglês ter me dito que o trem correto chegaria em em 5 minutos naquela mesma plataforma, eu teria desabado em prantos! Porque não havia absolutamente nada nem ninguém com quem eu pudesse me informar.

Apesar de tudo, se eu voltaria a Berlim? Sim. Cidade interessantíssima. Pesada, escura, difícil, talvez por isso estranhamente atraente. A História pulula em toda parte. Edifícios ainda tem marcas de tiros. Ouve-se vozes, enxerga-se imagens e fantasmas de tudo e todos que já passaram por ali.

Mas confesso que, quando cheguei a Praga, respirei aliviada.

(Abaixo, foto que fez sucesso no facebook: o Portão de Brandenburgo ao entardecer, com show de luzes).



segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Dormindo com guerreiros macedônios

Petruschesvka abriu a porta. Baixinha, cabelos ruivos com a raiz branca, alvoroçados. Mais de 70, menos de 80. Olhos puxados, olhar incisivo e uma série de recomendações em inglês truncado que me esforcei para compreender - pois senti que disso dependeria nossa relação durante cinco dias que passaria em sua casa em Frankfurt, Alemanha.

À medida que entrava pelo hall, vi a quantidade de quadros nas paredes. Pinturas de variados estilos de cima a baixo. "A senhora pintou esses quadros?" "Claro que não! Isso aqui é um museu de Arte Macedônia. Todos os quadros são de artistas da Macedônia".

Entrei no meu quarto e me deparei com um quadro enorme, desses que ocupam toda a parede, onde uma moça vestida com roupas típicas me mirava de forma inquisidora, tendo por trás uma tropa de guerreiros Macedônios com cara de poucos amigos. "Aqui é a sua cama", apontou a mulher. De frente para o quadro.


Foi difícil dormir na primeira noite... Mas, no dia seguinte, os olhares já não pareciam tão hostis. Da mesma forma, eu e meus companheiros de estadia fomos percebendo que a Petruschevska, apesar das recomendações incessantes sobre o aquecedor, as fechaduras das portas, quais luzes acender, também sabia ser doce e carinhosa.

Quando uma de nós ficou resfriada e ela preparou um chá com limão e gotas de licor macedônio. Mostrou-nos todo o museu, inclusive o porão, onde há manequins com roupas tipicas e adereços de prata e madrepérola. Ficamos sabendo que a Macedônia é, hoje, uma república situada em meio a cinco países: Bulgária, Grécia, Sérvia, Kosovo e Albânia.

Petruschevska nasceu na região onde fica a Grecia, mas a família logo foi embora. Conheceu o marido (mais novo que ela) tarde e não tiveram filhos. Ele era poeta e começou a reunir os quadros para o Museu da Macedônia. Há cerca de 15 anos, morreu de causa natural durante uma das Feiras do Livro de Frankfurt, deixando a mulher sozinha na imensa casa de quatro andares e não sei quantos quartos, todos ocupados com dezenas de obras de artistas macedonios. Na época da feira do livro, ela aluga os quartos, talvez para não se sentir tão só no aniversário da morte do marido.

No dia da minha partida - fui a última a deixar a casa -, Petruschevska me ofereceu café da manhã com pão preto e geleia de marmelos que ela mesma preparou. Ainda fez um sanduíche e me deu junto com uma maçã. Na hora de ir embora eu a abracei e pedi que abrisse a porta, de acordo com a tradição brasileira, para eu voltar logo a estar com ela no Museu de Arte Macedônia em Frankfurt.

sábado, 5 de outubro de 2013

Festa de escola

Escolas e editoras são entidades muito parecidas. Nenhuma é perfeita, as duas são cheias de defeitos e os clientes - sejam pais ou escritores - estão sempre insatisfeitos.

A escola onde matriculei meus filhos quando eram bebês e onde um deles está até hoje - a outra já entrou na faculdade - não foge a regra. É um colégio 'progressista', 'liberal' onde estudam muitos filhos de artistas. Como tudo na vida, tem um lado bom e um lado ruim. Em alguns momentos, lamentei tê-los colocado lá. Mas existe uma época do ano em que esqueço os defeitos e me vem a certeza: fiz bem. Foi a escolha certa.

É a Semana da Cultura. Durante uma semana os alunos preparam a escola para ser um imenso pavilhão de exposições dos trabalhos realizados durante o ano. No sábado, os pais são recebidos com café da manhã e visitam as salas onde há videos, instalações, declamação de poesias, performances. O clímax é o sarau de música no ginásio.

A cada ano, a Semana da Cultura é uma surpresa e uma emoção. Vejo os rostos dos colegas dos meus filhos - a maioria eu conheço desde que usava fralda e chupeta - se transformando. Uns, que não via faz tempo, reconheço os traços. Outros apresentam poemas de uma profundidade que eu não imaginava ou cantam lindamente. E, de repente, sou impactada pela consciência do tempo que passou e do que está por vir.

Esses jovens que eram bebês cresceram, se tornarão adultos, vão namorar, casar, trabalhar, procriar, sofrer, viajar, amadurecer... A grande aventura do ser humano se repetindo de forma única e especial em cada um deles.

E logo virão os filhos, que também serão matriculados em colégios, e quem sabe um dia, quando esses jovens forem pais e assistirem alguma festa de escola, terão a mesma percepção que eu tive, da infinitude e finitude do tempo, como dois lados de uma mesma moeda.

domingo, 22 de setembro de 2013

Um dia muito louco

A gente vive tentando domar a rotina, faz uma lista de atividades e vai 'ticando' cada uma, e, no fim do dia, quando demos conta de quase todas, gritamos internamente: "Gooool!" Que bobagem, pois de repente a vida dá um solavanco, nos joga no chão, depois joga para o alto como quem diz: "Acorda!" Porque temos tendencia a ser robozinhos. "Acordaaaaa!" E, de repente, estou viva!

No sábado, levantei cedo com a lista em punho: levar a mãe ao dentista, ir ao churrasco do sobrinho neto na Barra, voltar ao Leblon para o chope com as amigas de faculdade, e ainda prestigiar o karaokê etílico no aniversário de outro amigo à noite.

O dentista com a mãe correu bem. Logo depois, acenaram-me com um ingresso para o Rock in Rio, que entendi que era de graça, mas depois soube que tinha que pagar :( A caminho de ir buscar o bilhete, roubaram meu celular com todos os contatos (nem vi, só a bolsa aberta). Após bloquear a linha e comprar novo aparelho, hora e meia de engarrafamento até a Barra. Chegando lá: "Ainda tem churrasco?" (morta de fome) "Ah, não era churrasco, são lanchinhos..." :(

Aí parei. Comi uns hamburguinhos, curti a companhia dos sobrinhos, recebi uma dose de Amor (seiva pura), e me levantei de novo... Rumo à cidade do Rock! No meio do caminho, a bateria do novo celular arriou e não tinha mais como falar com ninguém.

Fui ao Rock in Rio sozinha, andei por todos os lados, fui na montanha russa, desfrutei da companhia de várias pessoas em momentos distintos da noite. Assisti Gogol Bordello e Lenine (ótimos!), show de dança e música celta (lindo!), John Mayer e o espetacular Bruce Springsteen, que me ressuscitou quando eu já tinha morrido.

Antes de ir embora, olhei a Cidade do Rock, mirei o céu e agradeci: "Obrigada, meu Deus, pelo dia de hoje. Obrigada por estar Viva".