sábado, 13 de setembro de 2014

Um toque do Pitanguy


Abro o jornal O Globo e me deparo com a foto do Prof. Ivo Pitanguy e a reportagem sobre o lançamento de seu novo livro de memórias, "Viver vale a pena". De dezembro de 2013 a abril de 2014 tive a honra de desfrutar vários momentos na presença desse ser extraordinário, durante a edição de seu livro para a editora Casa da Palavra, pela qual fui responsável. É engraçado como as coisas voltam na vida da gente. Pois aos 9 anos, o Dr. Pitanguy operou a minha testa. Tem um dedo do Pitanguy nesse rostinho aqui.

Sou filha de pais separados e passava os domingos com o meu pai, Justino Martins, em sua casa na Joatinga, Barra da Tijuca. Nessa época, costumávamos ir à piscina no Clube Costa Brava, pois a nossa ainda estava em construção.

O Costa Brava tem uma piscina escavada nas rochas e cheia de água do mar. Meio perigosa, essa piscina. Várias vezes me bati sem querer nas pedras pontiagudas e o machucado era sempre feio. Mas era justamente dessa que o meu pai mais gostava. Enquanto fazia sauna e nadava, eu brincava sozinha ou, com sorte, arranjava uma amiga.

Certo dia, fomos ao clube levando a Carmen, filha do vizinho, mais velha e bem mais esperta que eu. Foi ideia da Carmen se aventurar nas pedras fora dos limites do clube, junto ao mar. Nós não sabíamos que naquele dia a maré estava alta e havia ressaca.

Só me lembro de uma parede de água se levantando na minha frente. A imagem seguinte é a Carmen encostada numa pedra olhando para mim e chorando. O mar me arrastava, mas segurei numas plantas no fundo – por sorte, caí em uma poça de repleta de algas e por isso, não fui tragada pelo oceano. Em seguida, um homem forte apareceu e me carregou nos braços. Não era o meu pai.

Justino lia o jornal calmamente quando (depois costumava contar): “Apareceu um homem com a Valéria no colo, coberta de sangue”. Resumindo: fui levada para a emergência de um hospital público onde radiografaram minha cabeça, concluíram que todos os parafusos ainda estavam no lugar e me costuraram – nove pontos toscos, um para cada ano de vida.

Chegando em casa, minha mãe queria bater no meu pai. Correu atrás dele ao redor da mesa de jantar. Depois que ele foi embora, me deu banho na banheira, lavando com cuidado o meu cabelo para não molhar o curativo. Quando me levantei, a água era cor de sangue.

Passado um ano, Justino me levou ao Pitanguy, que me examinou e me operou, cortando fora a cicatriz tosca e juntando novamente a pele com 23 minúsculos pontos feitos com linha ultra fina.

Ficou ótimo, e assim me tornei parente do Harry Potter.

2 comentários:

Fernanda disse...

Valéria você é o poema em pessoa.
Teremos o prazer de em breve termos outro livro seu para saborearmos!
Um beijo e meu orgulho da bela pessoa que você é!
Fernanda.

Lucas Santana disse...

Olá Valéria!
Bem, faz um bocado de tempo que não leio seu blog - quase meia-década para ser mais preciso. Nunca postava, apenas lia um texto ou outro, mas lá atrás, em 2010, você me deixou um coment que muito estimo. Bem, colocarei em dia a leitura adquirindo seu livro. Espero comentar ainda muitas vezes. Pelo visto, a mágica que tu usa é das palavras e o jeito de tratá-las. Bj