sábado, 9 de agosto de 2014

A flecha e o arco

Meu filho foi morar com o pai. Ao longo da vida vi isso acontecer várias vezes com minhas amigas separadas e mães de filhos homens. Entendi que era comum: chega uma hora em que os meninos querem conviver com o pai, viver a vida de homem para homem. Geralmente é no final da adolescência, quando o trabalho braçal de criar realizado pelas mães deixa de ser necessário.

Lembro de uma amiga, mãe de um filho único, muito agarrada a ele, a quem preveni:

- Te prepara... Um dia ele vai querer morar com o pai.

- Ah, mas não vai mesmo. Eu não deixo!

- Mas e se for a vontade dele?

- Não quero nem saber! – em seguida mudou de assunto.

Outra, cujo casal de filhos decidiu morar com o pai em uma cidade diferente, falou algo que nunca esqueci:

- Me sinto como uma árvore que foi arrancada e está com as raízes expostas.

Eu mesma morei com meu pai dos oito aos nove anos, numa época em que isso não existia. Era a única criança filha de pais separados na turma da escola e ainda morava com o pai. Ele tinha uma mulher que cuidava bem de mim e era muito boa a convivência com ele quando estava em casa. Mas confesso que me sentia mais confortável junto da minha mãe, apesar de todos os problemas dela, da casa ser pequena e de vivermos mais ‘apertadas’ em todos os sentidos.

A família contemporânea tem infinitos arranjos e isso me parece bom. Mas vou lhes dizer: um filho que sai de casa de repente é algo duro de encarar.

Lembro os versos de Khalil Gibran Khalil:

Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O Arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do Arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como Ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável
”.

A saída do redemoinho de tristeza, creio, é nos concentrar em nossa trajetória de flecha (afinal somos filhos também): retomar projetos, ocupar de forma criativa o espaço vazio.

Um comentário:

Mônica disse...

Valéria
Eu deveria arrumar um tempo pra vim aqui mais vezes pois a gente fica aqui lembrando do passado.
E eu preciso também te telefonar ou ir ao Rio. Mamãe levou um pequeno tombo duas vezes < Nenhuma delas sem quebrar nada mas esta sentindo dor ate hoje. A ultima tem poucos dias.
Valéria
Os meus irmãos homens saíram de Varginha aos 14 e 15 anos pra morar em Bh e estudarem em escolas melhores . Mamãe chamou o papai que estava trabalhando e disse que estava enfartando de tanta dor no peito que sentiu.
Papai respondeu. Vamos dar Graças a Deus porque podemos envia los para estudarem em escolas melhores. Assim terão um futuro melhor.
E foi o que aconteceu com ambos.
Por isso rezo para que esta experiencia de seu filho em morar com o pai o favoreça a ser uma pessoa melhor no futuro.
E que seu sofrimento seja passageiro como foi com mamãe.
com carinho Monica