Sentada no sofá da sala de casa, lendo os jornais em companhia da gata Piblu, é domingo à tarde. Uma velha música de um velho CD entra pelos meus ouvidos e abre várias portas de sentimentos e lembranças e sensações adormecidos. É Clube da Esquina nº 2, canção que deve exercer esse efeito sobre gerações de pessoas que têm hoje entre 40 e cinquenta e poucos anos. Eu nunca tive esse disco quando existiu em vinil, nem tenho o CD original, mas uma interpretação de Léo Gandelman no saxofone me fez parar a leitura do jornal para escutar. E então, eu me desliguei do que estava lendo e prestei atenção na minha sala de casa, que repentinamente se apresentou com cores e sons mais vivos e brilhantes, assim como a brisa que entrava pela janela passou a ser percebida pela minha pele como um carinho suave e lírico. Larguei o jornal no chão e me concentrei naquela experiência de observação da sala da minha casa, o lugar onde eu moro, entro e saio todos os dias, a maior parte das vezes apressada. A sala está sempre cheia de gente, crianças, TV ligada. Ou então vazia, iluminada apenas pela luz de um pequeno abajur – porque não gosto de ambientes escuros, mesmo que não estejam sendo utilizados.
Hoje à tarde, o telefone não tocou, as crianças estão fora e eu estou em paz como há muito tempo não me sentia. O tempo parou para eu olhar as nuvens que escorregavam lentamente no céu, iluminadas pela luz do sol que ocultavam, revelando-se em matizes do branco ao cinza. O vento suave balançando as plantas arrumadas num pedestal próximo da janela. A gata espichada preguiçosamente no chão, barriga pra cima, o pelo felpudo abrindo-se em camadas de cores semelhantes às das nuvens lá fora. As paredes verdes manchadas pelo tempo, pedindo uma nova camada de tinta que não sei quando virá. Os livros dispostos na estante lembrando-me do meu compromisso comigo mesma e com a minha missão no mundo.
A música acabou e voltei à leitura do jornal. O mundo chama.
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