O olhar de um homem aquece e queima. O olhar molhado, angustiado de um homem que deseja uma mulher me lembra o olhar de um cão que meu pai teve, um dinamarquês enorme e preto, que de vez em quando sumia de casa e passava dias distante. Eu perguntava à empregada e ela dizia, a cadela do vizinho está no cio, então, ele fica lá, do lado de fora do portão, dias a fio, esperando, esperando. Não volta pra casa, não come, não dorme. De fato, após uma semana o cão voltava magro, machucado pelas brigas com os concorrentes, e seu olhar era triste, molhado, sem consolo.
Outro dia, numa festa, tarde da noite, eu fui olhada por um homem que era mais jovem, não era bonito, nem estava bem vestido, mas seu olhar me aquecia e quase queimava. Eu estava rodeada de amigos, sem brecha pra ele se aproximar, e acho que não queria mesmo que se aproximasse. Mas ele me olhava, olhava. Certa hora, eu estava sentada, pernas cruzadas, mexendo distraidamente na fivela do sapato, e vi que ele olhava a minha mão. Então, ele levantou os olhos e nossos olhares se encontraram e eu fui queimada de leve, de raspão, mas foi bom, não doeu, não.
Vi esse homem uma única vez, é provável que nunca mais o veja, pois eu estava de passagem na cidade em que ele mora, mas não esqueço seu rosto, está claro e vívido na minha mente. Eu o evoco na hora em que quero para me sentir aquecida por aquele olhar urgente, molhado. Olhar que aquece e queima.
2 comentários:
Valéria querida,
estou em falta com você e com saudade. De vez em quando venho aqui ler seus textos e me encantar com esse seu talento para mim ainda desconhecido. Bela cronista (seria bloguista? rs) vc está se saindo. E... muito bom ter olhares que aquecem para nos lembrarmos. Beijo grande, C.
Passo.... (nada é perfeito)rs
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