quarta-feira, 24 de junho de 2009

O peso das lembranças

Outro momento marcante da viagem aconteceu durante a visita à casa de Lalo, chileno que vive em Sertãozinho. Recebeu-nos com bom vinho e run da Venezuela, segundo ele, o melhor que há. Em certo momento, percebi que a sala havia se esvaziado e fui atrás das pessoas, pela casa. Vi que estavam todas reunidas em um quarto que parecia ser um escritório. Ao perceber minha aproximação, Lalo me convidou a entrar.

- Estava mostrando a Luis e Carmen uma foto que eu sabia que os emocionaria.

Apontou um pôster com uma fotografia do poeta Pablo Neruda, grandão e gorducho como era, vestido com um poncho e abraçado a Salvador Allende.

- É uma bela foto – eu disse.

Perguntei a Lalo como havia sido chegar ao interior de São Paulo com vinte e poucos anos, sem família, sem dinheiro, e ter que construir tudo do zero.

- Foi horrível – disse – Mas aqui estamos e este é o meu lugar – fez um gesto que abarcava o quarto com as estantes cobertas de livros, alguns em espanhol, mas a maioria em português.

Logo todos saíram e ficamos eu, Carmen e Letícia, outra chilena que veio parar em Ribeirão Preto após o golpe militar de 1973. Carmen contou que na noite em que se deu o levante dos militares, a energia foi cortada e a cidade ficou às escuras. AS TVs e rádios foram controladas e as pessoas ficaram sem saber o que estava acontecendo, o que fazer ou aonde ir. Ela, que costumava dar abrigo a refugiados políticos em sua casa – inclusive brasileiros exilados após o golpe de 1964 – foi presa e levada a Vila Grimaldi.

- O que é Vila Grimaldi? – perguntei.

- Era um dos centros de tortura de presos políticos espalhados pelo Chile.

- E você foi...?

Letícia respondeu:

- Valéria, não existia destino diferente para quem passasse por um desses lugares.

Carmen olhou para mim e sorriu um sorriso triste, e por um segundo, seu rosto me pareceu infinitamente mais velho.



Continua: O amor 20 anos depois - A linda história de Luis Sepulveda e Carmen Yañez.

5 comentários:

Babi Mello disse...

Valéria, você deve ter aprendindo muito, afinal aprendemos mais quando ouvimos historias como esta e o mais importante e que elas nos fazem refletir. Acredito que eles amam o Brasil, como não amar, aquele que nos acolhe bem e nos traz a paz mesmo que distante de casa.
Bj!

Helena Duarte disse...

Valéria, só dando uma pasadinha pra te desejar um ótimo dia!!!
xeros!!!

Mônica disse...

Valéria
A História deste país é muito triste. Mas que bom que voce está conhecendo esta história mais de perto e melho do que os professores de História.

Nesta foto estâo minhas irmãs Andrea, Marilia, e eu. Tem outra que tem papai e mamae também. E a professora da mamae que hoje tem 105 anos.
Obrigada pelas visitinhas.

Continue a História
Com carinho Monica

Moda Trash disse...

Calma Valéria, irei fazer um 2º post sobre fetiche, aguarde!
Olha, sobre a blusa, diga-me o tamanho que vc comprou, para fazer outra. Quando estiver pronta, lhe aviso para marcarmos a troca, ok?
bjkasssssssss

Carolina disse...

Me arrepiei por trazer de volta lembranças de uma simples filha de exilados...
bjos